21.05.2022 – 07.01 – Um grão de café liga o Brasil na América do Sul a Trieste na Europa Central: a bebida preta representa, desde o século 19 até os dias atuais, o elo entre os dois países. Econômico, antes de tudo: a Itália é o terceiro maior importador de café do Brasil e Trieste é um dos principais portos por onde ainda transitam as sacas, destinadas às grandes empresas do setor. Mas sem descurar o vínculo político e cultural, com raízes que inervam este império austro-húngaro que olhava com interesse para a América do Sul no século XIX.
Na verdade, o Brasil optou por separar-se de Portugal em 1821primeiro elegendo uma monarquia constitucional chefiada pelo príncipe português Pietro até 1889 e depois escolhendo a forma republicana (a chamada “Estados Unidos do Brasil“; oficializado em 24 de fevereiro de 1891). O monarca destronado Pedro II escolheu Trieste como local de desembarque na Europa; e ainda na cidade-porto ele se levantou nos mesmos anos um depósito permanente do Instituto Brasileiro do Café.
O primeiro cônsul geral foi, já em 1821, Joachino Pereira Vianna de Lima que tinha seu escritório no Corsia Stadion 1702, hoje via Cesare Battisti. Após os tratados de 1826 com os estados sul-americanos, o primeiro Trieste a enviar um navio para o Brasil foi Aron Parente; Giulio Caprin nos dá um testemunho pitoresco:
“Quando as tripulações dos navios, que estavam na Califórnia, escaparam para garimpar ouro, a tripulação de seu barco (ou seja, um escuna ndt) Aron foi o único a permanecer no local, oferecendo um exemplo muito raro dessa disciplina que ele alcançou como armador, tratando com generosidade seus capitães e marinheiros“.
Por volta da segunda metade do século XIX, junto com as crescentes relações comerciais com Trieste, o novo cônsul José Sully de Souza transferiu seu escritório para a Piazza Giuseppina, atual Piazza Venezia.
Em 20 de março de 1868, o cargo passou para o famoso Barão Marco Morpurgo, então presidente do Lloyd austríaco (1878-1896). O cônsul acolheu, no maior sigilo, o Imperador e Imperatriz do Brasil, sob o falso nome de Conde e Condessa de Alcântara (1891). A notícia, no entanto, foi descoberta e transmitida ao chanceler italiano pelo consulado de mesmo nome, com ouvidos muito atentos a qualquer coisa inusitada que acontecesse em Trieste.
A proclamação da república marcou uma intensificação das relações; especialmente porque Trieste, superando Fiume, passou a representar a jurisdição de todo o Império Austro-Húngaro. A maior parte da atividade do consulado era de natureza prática, relacionada ao tráfego de mercadorias e procedimentos aduaneiros.
Os anos entre as duas guerras mundiais tiveram uma continuidade substancial no trabalho do Consulado Brasileiro, com a novidade de umimigração italiana contra o Brasil; uma contrapartida ao fluxo de entrada de mercadorias. O historiador Aldo Colleoni, por sua vez, cita uma bela passagem de Giorgio Tamaro:
“Nos dois navios de passageiros “Neptunia” e “Oceania” e em outros navios de carga, de fato, ocorreu um movimento considerável de entrada de mercadorias em Trieste, como celulose, papel e malte destinados aos mercados austríaco, tchecoslovaco, suíço e húngaro, compensado por um fluxo migratório significativo“.
Entre os cônsules a figura de Ivan Galvão; um brasileiro que gostava de passear pelos mercados de pulgas de Trieste, em busca de obras de arte. Ele foi o último cônsul; no 1942 o escritório foi de fato fechado devido ao rompimento das relações diplomáticas entre a Itália e os países da América do Sul.
A reabertura do consulado em Veneza após a Segunda Guerra Mundial andou de mãos dadas com 2 de janeiro de 1960, ao de Trieste, via Campo Marzio n.4. Eram os anos dourados do tráfico de café Juliano, onde este gigante de Trieste que outrora se estabelecera Primeiro Rovis. Nesta ocasião, Trieste lançou uma geminação com a cidade brasileira de Santos; daí o nome do espaço aberto em frente ao Vieux Port Franc, perto da rodoviária (1982). Durante esses anos, Trieste recuperou seu interesse pelo Brasil também culturalmente, especialmente pela ópera; um interesse que sobreviveu até os dias de hoje, ao contrário do Consulado que foi fechado vinte anos depois, em 30 de junho de 1986.
Fontes: Aldo Colleoni, O papel geopolítico dos cônsules em Trieste de 1732 a 2006Trieste, Italo Svevo, Universidade de Trieste, 2006
Trieste e o porto. Uma história em imagensvolume 2, 1938-2007, The Piccolo Library, Trieste, 2007
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