Muitos anos atrás, quando criança, meu pai me levou ao estádio pela primeira vez quando a Roma jogou contra o Grande Torino. Eu tendia a ser romanista, porque morava em Trastevere, onde todos apoiavam Roma.
No final do primeiro tempo, a Roma venceu por 1 a 0. Diante do gol de Amadei (eu li sobre isso anos depois nos almanaques, pois era muito jovem para escrevê-lo), um senhor ao meu lado levantou-se e gritou: “. ..é um!” Na segunda parte, as granadas cortaram sete aos pobres romanistas.
Alguns meses depois, meu pai me levou para ver a Lazio contra o Torino. E a Lazio, com aqueles monstros que humilharam a Roma diante de seus torcedores, conseguiu empatar. E talvez até tivessem vencido se o grande goleiro do Granada, Valerio Bacigalupo, não tivesse defendido um pênalti.
Cheguei à Lazio mas guardei uma grande simpatia por este Torino que sempre venceu e a quem devo a minha “Preguiça” que me acompanha há tantos anos.
E então houve a tragédia do Superga. A partir deste 4 de maio, um pedaço do coração de todos aqueles que repetiram de cor a cantiga de formação (Bacigalupo, Ballarin, Maroso, Grezar, Rigamonti, Castigliano, Menti, Loik, Gabetto, Mazzola, Ossola) virou uma granada.
E é por esta grande equipa – muitos historiadores dizem que foi a maior da história do nosso futebol – que me regozijei com o regresso do Torino à Serie A, após três anos de purgatório na divisão inferior. .
Pelo amor do Grande Torino, como diziam então e ainda dizem cinquenta anos depois. Um grupo de homens que se tornaram lendas em vida e que se tornaram lendas quando morreram.
Muitos anos se passaram e quem era criança na época lembra como era agora, o ritual dominical de nomeação dos jogadores, falado pelo rádio – que era então o único meio de comunicação em tempo real – pela voz de Nicolò Carosio: “Bacigalupo, Ballarin, Maroso… Grezar, Rigamonti, Castigliano… Menti, Loik, Gabetto, Mazzola, Ossola…”. Esta sucessão de nomes tornou-se quase uma canção de ninar, e representou uma pequena obsessão, até porque esta equipa sempre ganhou, mesmo à nossa, de coração, como se costuma dizer… Estes nomes eram muitas vezes os mesmos da selecção nacional, quase todos eles. E nos autocolantes impressos a cores grosseiras, que trocávamos na rua, com os nossos calções, estes rostos já nos eram familiares, com esta magreza típica do pós-guerra, estes cabelos brilhantes repartidos, como os de Ossola e Gabetto, ou os cachos rebeldes do Capitão Mazzola, ou aqueles invisíveis, porque cobertos com um gorro, de Bacigalupo, o guardião mágico. Sim, esses rostos eram como rostos de casa, familiares e ao mesmo tempo distantes, inacessíveis, lendários e portanto imortais como deuses… Haveria um time capaz de vencê-los? De jeito nenhum… Uma vitória atrás da outra, um campeonato atrás do outro, sempre “Bacigalupo, Ballarin, Maroso… Castigliano, Rigamonti, Grezar…”, com o escudo no peito e a bola nos pés, invencíveis como cavaleiros descidos do céu. .. Eis que desceu do céu … e assim só o céu, pela vontade de outros deuses, poderia talvez tê-los derrotado, dominado.
Por uma incrível série de circunstâncias, algumas ainda envoltas em mistério, aconteceu e “só o céu os dominou”, como diz a letra de uma música, nascida logo após o acontecimento que chocou a Itália e o mundo, quando o avião que os trouxe de volta a Turim depois que um amistoso disputado em Portugal se chocou contra a Basílica de Superga e encerrou sua história.
Era 4 de maio de 1949.
E a partir desse momento, toda vez que vejo as camisas granadas entrarem em campo contra a minha Lazio, meu coração bate ainda mais rápido e a lembrança voa para o capitão Valentino Mazzola que ostensivamente arregaça as mangas para dizer aos companheiros que era hora da defesa, e o tempo para o goleiro adversário recuperar a bola da bolsa, como disseram os jornalistas na época. A lendária e terrível granada de um quarto de hora! Bacigalupo… Ballarin… Maroso… Grezar… Rigamonti… Castigliano… Menti… Loïk… Gabetto… Mazzola… Ossola…
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