Lá Tribunal Europeu dos Direitos Humanos decidiu que mensagens privadas publicadas pelo seu cônjuge num site de encontros podem ser utilizadas em processos de divórcio, desde que a divulgação da correspondência tenha um efeito limitado na sua vida privada. De acordo com o TEDH, não há, portanto, violação do artigo 8.º (Direito ao respeito pela vida privada e pela correspondência) de Convenção Europeia dos Direitos Humanos em caso de envio da correspondência online do cônjuge ao tribunal para estabelecer uma responsabilidade compartilhada em separação.
O Tribunal de Estrasburgo ( Acórdão da Câmara no caso MP v. Portugal, recurso n.º 27516/14 ), foi chamada a examinar o caso de uma mulher que reclamava que seu marido não havia sido condenado por ter incluído no processo de divórcio as mensagens que ela havia escrito para homens, mesmo sendo casada, em um site de namoro. Acto que, segundo a recorrente, constituiu uma violação do sigilo da correspondência e da sua vida privada. O TEDH, no entanto, decidiu a favor dos juízes portugueses, concluindo, em particular, que “os efeitos da divulgação das mensagens contestadas na vida privada do requerente foram limitados”, porque “só foram divulgadas no contexto de processos cíveis” para aos quais o público tem acesso “limitado”.
O Tribunal constatou ainda que os emails nem sequer foram examinados, uma vez que o Tribunal de Família de Lisboa não se pronunciou sobre o mérito dos pedidos do marido. Segundo o TEDH, as autoridades portuguesas avaliaram, portanto, os interesses concorrentes de forma equilibrada, de acordo com os critérios estabelecidos na sua jurisprudência.
O caso – Uma cidadã espanhola residente em Madrid casou-se em Julho de 2001 com um português com quem teve dois filhos. Por compromissos profissionais, o casal vivia dividido entre Portugal e Espanha. Em junho de 2011, com a deterioração das relações conjugais, a mulher decidiu viver permanentemente em Espanha com os filhos. E em julho do mesmo ano ela foi ao tribunal de Madrid para iniciar o processo de divórcio. Em agosto de 2011, o marido apresentou queixa no tribunal de Lisboa solicitando o repatriamento dos filhos e o estabelecimento da sua residência em Portugal. E anexou ao arquivo os e-mails encontrados em novembro de 2010 no computador da família que sua esposa havia trocado com homens em um site de namoro, alegando que demonstravam que ele havia casos extraconjugais durante o casamento. Posteriormente, em outubro de 2011, pediu o divórcio em Portugal.
Motivação – De acordo com a lei portuguesa, o acesso ao conteúdo de cartas ou telecomunicações sem o consentimento do autor é punível criminalmente. No entanto, os tribunais portugueses, de acordo com o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, encontraram uma justo equilíbrio entre interesses em causa, nomeadamente, por um lado, o direito da requerente ao respeito pela sua vida privada e, por outro lado, o direito do marido a uma oportunidade razoável para apresentar o seu caso nos dois processos cíveis que, pela sua própria natureza, influência na vida privada.
No que diz respeito ao acesso às mensagens electrónicas, o TEDH observou que, segundo o Tribunal da Relação de Lisboa, foi o requerente quem dê ao seu marido acesso total para o dele conta de e-mails no site de namoro e que, portanto, essas mensagens faziam parte da vida privada do casal. Segundo o Tribunal, as coisas não são claras, especialmente tendo em conta a situação de conflito entre os cônjuges, mas não existem razões suficientes para substituir a avaliação efetuada.
Por último, no que diz respeito à apresentação de emails privados no contexto de processos de divórcio, o TEDH decidiu a favor do Tribunal da Relação de Lisboa sobre a relevância dessas mensagens em processos cíveis que deveria dar origem a uma avaliação da situação pessoal dos cônjuges e da família. No entanto, lembrou que, em tal situação, a interferência na vida privada resultante da divulgação de tais informações deveria ser limitada ao estritamente necessário. E neste caso foi assim, uma vez que as mensagens só foram divulgadas em processos cíveis e o acesso público aos ficheiros foi limitado. Por fim, as mensagens não foram examinadas na prática, pois o tribunal não se pronunciou sobre o mérito dos pedidos do marido.
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