É uma pequena aldeia como muitas outras em Itália: uma centena de casas espalhadas pela colina, uma loja, um bar, o antigo bar. Sábado à noite, o gigantesco incêndio que assolou Portugal mergulhou os habitantes de Nodeirinho no cenário de um filme, daqueles onde em cada sequência é preciso tomar a decisão certa: se for numa direcção foge, se for para o outro você morre. Só que tudo era verdade e não existiam super-heróis. Então o protagonista foi mais que coragem.
As vítimas
“Pedimos ajuda pelo menos trinta vezes durante a noite”, diz Maria do Céu. “Não temos como entrar em contato com você”, dizem eles. Vá para o lugar mais seguro possível. » Sim, claro, o que era “seguro” neste caos ardente? Ficar em casa ou fugir? Pouco mais de metade das 64 vítimas do desastre português de sábado à noite morreram em carros, com o resto a tentar defender as suas casas. Foi como jogar uma moeda. “O problema foi o vento – diz Maria –, tão forte que arrancou as telhas dos telhados e levou as chamas a centenas de metros.” Foi assim que Sidel Belchior, de 38 anos, morreu junto com o sobrinho Rodrigo, de 4 anos. Quando o fogo se aproximou de Nodeirinho, Sidel, no carro, foi procurar uma saída da cidade. “Era o mais lógico fazer naquela altura – explica a sogra, Ermelinda Gomes – também proteger o Rodrigo e o Sidel era um homem forte e rápido, era certo que ele tentasse”.
Os testemunhos
A mulher não diz porque o tio também trouxe a criança. Talvez a criança parecesse mais “segura”, amarrada na cadeirinha, pronta para escapar. “Primeiro Sidel foi atropelado por outro carro – diz Ermelinda – depois, enquanto ele se afastava às cegas e conseguia escapar, Sidel dirigia com cuidado, confortando o pequeno”. Uma árvore em chamas caiu sobre o carro deles. O tio deve ter conseguido libertar o sobrinho e sair do carro. “Eles os encontraram entrelaçados, carbonizados, a poucos metros de distância.” Sua esposa Ana está segura e a casa também: as chamas nunca chegaram. Se eles também tivessem ficado, todos estariam vivos. “Também queríamos ir embora – diz Maria do Céu Silva -, foi horrível, ouvíamos as árvores a cair, as janelas a partir-se, as botijas de gás a rebentar. Louco. No entanto, não tínhamos gasolina suficiente no carro. Foi assim que o meu marido Manuel teve a ideia da água. “Não podemos queimar lá.” Mergulhamos na depressão e aos poucos outros vizinhos se juntaram a nós.”
Sorte e azar
O pior foi por volta das duas da manhã. “Doze de nós estávamos tomando banho na banheira de pedra há horas. Aqueles que se sentiram capazes saíram por alguns minutos para se regar e manter as chamas afastadas, depois voltaram para se refrescar. O fogo chegou muito perto. O ar ficando cada vez mais quente, cheio de faíscas, irrespirável. Achei que íamos morrer sufocados, que era melhor fugirmos. Em vez disso, em algum momento, o tabagismo diminuiu. Obviamente não era a nossa hora. » O percurso que teriam seguido com um pouco mais de combustível tê-los-ia matado. Esta é a EN236 onde cinco carros colidiram, bloqueando a passagem de todos. Quarenta e sete pessoas morreram neste pedaço de asfalto. Não há super-heróis em Portugal, apenas sorte ou azar.
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