Deus, país, família. O lema do ditador António de Oliveira Salazar voltou a aquecer o coração de grande parte dos portugueses: o Chega, o partido de extrema-direita que para muitos se inspira no líder fascista que governou o país durante trinta anos, obteve 18% de votos nas eleições gerais em Portugal. As urnas decretaram o fim do domínio do Partido Socialista do primeiro-ministro cessante, António Costa, e a vitória de Luís Montenegro, líder da coligação de centro-direita Aliança Democrática (AD). Mas o futuro do novo governo é mais do que incerto, precisamente por causa do boom do Chega.
Nascido em 2019 da cisão de um grupo de representantes do PSD (uma ramificação do Ad) liderado por André Ventura, o Chega consolidou-se em muito pouco tempo na cena política portuguesa ao apostar no combate à imigração e à criminalidade, e denunciando a corrupção do establishment em Lisboa. Ventura rejeitou repetidamente as acusações de racismo contra o seu partido, mas as ligações do partido a movimentos fascistas e neonazis foram destacadas por várias investigações.
A relação do Projeto Global Contra o Ódio e o Extremismo (Gpahe), organização especializada no estudo de movimentos extremistas, acusou o Chega de ter acolhido supremacistas brancos nas suas fileiras. O porta-voz nacional da organização juvenil do partido, Rui Miguel Candeias Cardoso, tem repetidamente “promovido a retórica anti-imigração da ‘Grande Substituição’”, a mesma adoptada por vários supremacistas que têm cometido massacres em todo o mundo contra negros e judeus. . Outra destacada representante do movimento juvenil Chega, Joana Pinto, não esconde a sua paixão pelo ditador Salazar: “Porquê comemorar o 25 de Abril (dia do início da Revolução dos Cravos, o movimento que acabou com o fascismo e trouxe de volta a democracia ao país, nota do editor) quando poderemos comemorar o 28 de Abril (aniversário de Salazar)?”, lemos num dos seus trabalho em X.
Ventura tentou distanciar-se dos representantes mais extremistas e constrangedores, tentando estabelecer-se como um potencial líder do governo. Mas até agora, o centro-direita português rejeitou qualquer forma de aliança com o Chega. Montenegro anunciou que manteria um cordão sanitário mesmo depois destas eleições, como prometido durante a campanha eleitoral: o seu partido, Ad, obteve quase 30% dos votos e 79 assentos, demasiado poucos para poder governar sozinho. Seriam necessários os 48 deputados do Chega, mas o líder moderado não pretende voltar atrás na promessa. É por isso que enviou uma mensagem ao centro-esquerda de que, embora permaneça na oposição, não faz o jogo da extrema direita e se envolve numa cooperação construtiva para o país.
Para além das questões nacionais, o resultado português poderá ter impacto nas futuras estruturas europeias. O Chega, aliado da Liga em Bruxelas, poderá aumentar a patrulha dos soberanistas no Parlamento Europeu. Por outro lado, com a derrota do PS, os socialistas perdem mais um chefe de governo na UE (até à data, apenas 4 líderes socialistas sentam-se à mesa dos 27) e correm também o risco de perder a possibilidade de nomear o próximo presidente do União Europeia. Conselho, sede que tem entre os seus candidatos o ex-primeiro-ministro português António Costa.
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